23.6.08

Disseram por aí

Uma rápida repassada no que se disse sobre Personal Che nas últimas semanas:

• Na Folha (para assinantes), Pedro Butcher faz o devido paralelo entre a idéia do filme e as idéias do francês Roland Barthes:

"Se Roland Barthes (1915-1980) estivesse vivo e escrevesse uma atualização para seu indispensável "Mitologias", publicado pela primeira vez em 1957, certamente incluiria um capítulo sobre Che Guevara. O documentário "Personal Che" pode não citar Barthes diretamente, mas é uma minuciosa análise da construção de um mito contemporâneo à moda do semiólogo francês. De forma complexa e multifacetada, o filme do brasileiro Douglas Duarte e da colombiana Adriana Mariño percorre o mundo para investigar as várias 'releituras' sofridas pela figura do revolucionário argentino."
• O crítico Ricardo Calil arremata dois bons textos curtos sobre o documentário. No Guia da Folha, ressalta o "ângulo inusitado" escolhido pelo filme. No seu blog, expande o conceito:
"Com [seus] personagens, “Personal Che” poderia ser apenas uma reportagem jornalística competente e curiosa. Mas ele torna-se um belo documentário nos momentos em que os diretores desconstroem a visão dos entrevistados sobre Che. Como na cena em que eles dizem à camponesa boliviana que Guevara era ateu e materialista, o que provoca um silêncio interminável. Ou quando mostra fotos de Che morto ao taxista cubano que só conhecia sua imagem de guerrilheiro destemido. Nesses momentos, “Personal Che” alcança o que poucos documentários conseguem: dar a seus personagens uma nova compreensão da realidade e registrar o exato instante em que isso ocorre."
• No Estadão, Luiz Carlos Merten escreve:
"No filme, Che é ídolo tanto de camponeses bolivianos e de jovens que ainda sonham com a revolução quanto de skinheads que o comparam a Adolf Hitler. Mais do que revelar a verdade por trás do mito, Douglas e Adriana seguem o caminho inverso e exploram o mito por trás da verdade.
• No Globo, o bonequinho de Carlos Alberto Mattos, mestre do obrigatório DocBlog, aplaude de pé e afirma:
"Muitos filmes já foram feitos sobre o mito Che Guevara, e isso faz arte do mito. Mas poucos têm a originalidade e o frescor desta atração."
• Nelson Gobbi, do JB, deu matéria e resenha sobre o filme. Nessa última, diz:
"O grande mérito de Personal Che é deter-se na imagem [de Che] e suas incontáveis variações, passando ao largo da história do guerrilheiro. Dessa forma, a dupla mostra como ela é apropriada em várias partes do mundo. (...) Evitando manipulações, o documentário registra a história sendo reescrita diariamente.
• Já para Alysson Oliveira, da Reuters, o mérito do filme é "levantar o debate e não se preocupar em desvendar Che Guevara":
"O que o filme nunca se propõe é desmistificar a figura de Che. Pelo contrário, os diretores trabalham questionando as imagens conhecidas e introduzindo algumas novas -- como um musical libanês que conta a vida do guerrilheiro, ou um político de Hong Kong que só usa camiseta com a foto de Korda, entre outros, ampliando o leque da discussão."
• Em outros lugares, Geo Euzébio, do CinePlayers, se pergunta "Como pensar sobre um símbolo que deixou de ser homem?" e me questiona a respeito da já famosa "pergunta do ateu"; Olívia Mendonça, d'O Dia, detalha os bastidores do filme; a Zé Pereira e a RollingStone comemoram a (breve, é verdade) carreira que Che deu nos blockbusters hollywodianos; Amanda Lourenço, da Revista de Cinema, diz que o doc "prova que Che Guevara ainda vive nos dias de hoje"; e finalmente o bizarricérrimo site da Agência FM Network - Notícias do Mundo crítica o filme por "manter a homossexualidade do médico-terrorista intocada".

O que dizer? Se soubéssemos que ela existia podíamos até tentar tocá-la!

Adendo posterior: Inadvertidamente não incluí a crítica de Luiz Zanin Oricchio que acompanhou a matéria do Merten, no Estadão. Um pedaço:
"A dupla não teme confrontar a beata que acende uma vela para o Che com a revelação de que o revolucionário era marxista e ateu. Ao skinhead neofascista, revelam, como se isso fosse necessário, que o Che era o modelo acabado de homem de esquerda. Dessas dissonâncias entre o que era o homem e no que se torna a lenda, nasce a riqueza contrastada do filme."

2 comments:

Heitor Augusto said...

oi douglas, tudo bem? sou heitor augusto, colega da amanda da revista de cinema.

vi teu filme ontem e acrescentaria um adendo nesse montão de crítica boa que tu citou aí acima (gostei do butcher citando o barthes e do calil falando da mudança de opinião do entrevistado -- a cara da senhora boliviana é IMPAGÁVEL): sociedade do consumo.

(tudo bem, não é muito cool falar de feitichismo da mercadoria, esvaziamento do sentido..., mas saí com a sensação disso na cabeça, mesmo que teus entrevistados fiquem mais no mito)

abraços e bons ventos pra vcs.

PS: como vc achou tanto personagem bom? reparei que a revista que vcs mostraram pro taxista cubano trazia uma reportagem falando do "são che". foi este o ponto de partida?

tdp said...

Heitor,

Nem é questão de ser cool ou não: o fetichismo e o consumismo estão no coração desse Che. Acho que tocamos nisso a partir do cara em Nova Jersey e em alguns planos (ainda que não tenhamos nos demorado nesse ponto).

Quanto à revista: não. Na verdade, foi a Adriana Mariño quem escreveu aquela reportagem. Nossa primeira filmagem (na Bolívia) foi paga com matérias jornalísticas que fizemos lá. Essa foi uma delas.

Bo que vc gostou do filme. Espalhe, que senão saímos de cartaz!

Abraço,
Douglas